sábado, 27 de fevereiro de 2016

Procurando o Planeta 9

Usando observações da sonda Cassini, uma equipe de astrônomos do Observatório de Paris e do Observatório de la Côte d'Azur foi capaz de especificar as posições possíveis de um nono planeta no Sistema Solar.

ilustração do Planeta 9

© Caltech/R. Hurt (ilustração do Planeta 9)

Os objetos do Cinturão de Kuiper, corpos pequenos parecidos com Plutão localizados além de Netuno, têm uma distribuição especial que é difícil de explicar por puro acaso. Foi isto que levou Konstantin Batygin e Mike Brown (Caltech, nos EUA) a propor, num artigo publicado no dia 20 de janeiro de 2016 na revista The Astronomical Journal, a existência de um nono planeta com 10 vezes a massa da Terra cujas perturbações sobre os objetos do Cinturão de Kuiper levaram à sua atual distribuição. Por meio de simulações numéricas, determinaram a órbita possível deste planeta. Para ser capaz de reproduzir a distribuição observada dos objetos do Cinturão de Kuiper, esta órbita, com um semieixo maior de 700 UA, deve ser muito excêntrica (e=0,6) e inclinada (30º em relação à eclíptica), mas o estudo de Batygin e Brown não propôs restrições sobre a atual posição do planeta. Isto não facilita a tarefa dos observadores que precisam procurar em todas as direções possíveis, em longitude, para tentar descobrir este planeta.

Desde 2003 que A. Fienga (astrônomo do Observatório de la Côte d'Azur), J. Laskar (astrônomo do Observatório de Paris e diretor de pesquisa do Centre National de la Recherche Scientifique) e a sua equipe estão desenvolvendo as efemérides planetárias INPOP, que calculam o movimento dos planetas no Sistema Solar com a maior precisão possível. Em particular, usando dados da sonda Cassini (NASA/ESA/ASI), conhece-se a distância entre a Terra e Saturno com uma incerteza de aproximadamente 100 metros. Os pesquisadores tiveram a ideia de usar o modelo INPOP para testar a possibilidade de acrescentar um nono planeta ao Sistema Solar, como proposto por Batygin e Brown.

No recente estudo, a equipe francesa mostra que, dependendo da posição do planeta a partir do seu periélio, o nono planeta induz perturbações na órbita de Saturno que podem ser detectadas através da análise dos dados de rádio da sonda Cassini, que orbita Saturno desde 2004. Os cientistas foram capazes de calcular o efeito induzido pelo nono planeta e comparar a órbita perturbada com os dados da Cassini. Para ângulos periélicos inferiores a 85º ou superiores a -65º, as perturbações induzidas pelo nono planeta são inconsistentes com as distâncias observadas da Cassini. O resultado é o mesmo para o setor de -130º a -100º. Este resultado permite excluir metade das direções em longitude, na qual o planeta poderá não ser encontrado. Por outro lado, verifica-se que, para algumas direções, a adição do nono planeta reduz as discrepâncias entre o modelo calculado pelos astrônomos e os dados observados, em comparação com o modelo que não inclui o nono planeta. Isto torna plausível, portanto, a presença do nono planeta para um ângulo periélico entre 108º e 129º, com uma probabilidade máxima para 117º.

análise dos dados de rádio da sonda Cassini

© Observatoire de Paris (análise dos dados de rádio da sonda Cassini)

Análise dos dados de rádio da sonda Cassini, que define áreas proibidas (vermelho) onde as perturbações criadas pelo planeta são inconsistentes com as observações, e uma área provável (verde) onde a adição do planeta melhora a previsão do modelo, reduzindo as diferenças entre os cálculos e os dados da Cassini. A posição dos resíduos mínimos e máximos é a localização mais provável do planeta (P9). A escala está em Unidades Astronômicas.

A existência de um nono planeta só poderá ser confirmada com observações diretas, mas ao restringir as possíveis direções para pesquisa, a equipe faz aqui uma contribuição importante na sua procura.

A órbita sugerida do Planeta Nove coloca-o muito longe do Sol, tão longe que quase não reflete luz suficiente para ser detectado. Por isso, os astrônomos estão usando truques. Em vez de observarem no visível, estão à procura de outros sinais improváveis que podem ajudar a diminuir a área de pesquisa.

Nicolas Cowan da Universidade McGill em Montreal, Canadá, e colegas, calcularam que deverá emitir o seu próprio tipo de sinal detectável em ondas de rádio. O planeta proposto será grande o suficiente para ter retido uma pequena quantidade de calor durante sua formação. Usando Urano e Netuno como modelos, a equipe calculou que o planeta deverá ter uma temperatura poucas dezenas de graus acima do zero absoluto, o que significa que irradia fracas ondas milimétricas de rádio.

Existem vários telescópios que estudam os céus nestes outros comprimentos de onda, apesar dos astrônomos caçadores de planetas normalmente não os usarem. Ao invés, estes telescópios são usados, por exemplo, para estudar a radiação cósmica de fundo em micro-ondas, o remanescente da primeira luz deixada para trás pelo Big Bang, que está na mesma região do espectro.

Os cosmólogos usam telescópios como o BICEP2 e o Planck para mapear a radiação e aprender mais sobre o Universo. Normalmente não se preocupam com meros planetas. A observação de um único ponto brilhante nestes comprimentos de onda não é suficiente para detectar um planeta, uma vez que pode ser apenas parte da radiação de fundo. Mas o movimento de um planeta deverá ajudar a destacar-se do fundo. Trabalhando com Nathan Kaib da Universidade de Oklahoma, EUA, a equipe calculou que a velocidade do Planeta Nove através do céu deverá ser diferente das dos milhares de asteroides igualmente brilhantes, tornando-o mais fácil de detectar com apenas alguns meses de observações.

Muitos telescópios usados para estudar a radiação cósmica de fundo em micro-ondas estão situados no polo sul com um campo de visão estreito. Isto é ideal para a cosmologia, mas não tão bom para a caça planetária; podem não estar apontando na direção do Planeta Nove. Os telescópios futuros irão procurar zonas mais amplas do céu, aumentando as hipóteses de avistar o planeta.

Este trabalho foi publicado na revista Astronomy & Astrophysics no dia 22 de fevereiro de 2016.

Fonte: Observatoire de Paris

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